TEXTOSRESENHAS

Análise de "Vestígios", de Waldomiro Manfroi - Virgínia H. Vianna Rocha

07 de setembro de 2015


"Já repeti o antigo encantamento, E a grande Deusa aos olhos se negou. Já repeti, nas pausas do amplo vento, As orações cuja alma é um ser fecundo. Nada o abismo deu ou o céu mostrou. Só o vento volta onde estou toda e só, E tudo dorme no confuso mundo.”
(Fernando Pessoa – O último sortilégio)
 
Narrativa simples, direta. Não desvia o conflito que instaura em momento algum. O crescendo de descobertas conduz firme a trama ao desfecho; antecipa a provável quebra familiar. Quem incompreendido, filho ou pai? Sacrifício ou sortilégio? Vestígios, frente às raízes desenterradas, contrapõem conflitos até onde o vento sopra sem piedade. Sacro ofício de amparar o pai que desconhece o filho - saga do abandono à misericórdia da assistência. Sortilégio na restauração dos desenganos – do passado ao presente. Muitos filhos aprendem a conviver (sobreviver, quem sabe) com o abandono paterno através do esquecimento. A via geral erguer-se a partir do apagamento das memórias (buracos interiores). Não raro, adiante, se defrontam com contingências exigíveis do amor desfeito (obrigação moral mínima) de alcançar sobrevida digna a quem dispensou, por volúpia ou egoísmo, assistir sua prole. Entre muitos, alguns (poucos) respondem em sentido contrário à negação do encargo. Irredutível, ao fim, a ilusão de vencer o desterro voltar ao presente. O pai, Mario, nunca constituiu família, ao que reafirma, em solilóquio, ao velho companheiro, inerte às palavras. Enquanto o filho deslembra rasgos no monólogo paterno, sua mulher, Flávia, insiste em dar coerência ao tempo em que coabitaram. Outro, Humberto, irmão do asilado, é quem deu curso às desvalias contadas pelo velho. O presumido tio de Eduardo torna-se real e impositivo no discurso de Flávia. A conotação familiar, revelada pelo velho, em nada destrói o vinculo antecedente com Eduardo; pouco importa ele negue desconhecê-la. Cresce a fonte de dissolução da relação conjugal atual, frágil, a cada sábado (pacto circunscreve as narrativas do velho às visitas realizadas). A morte de Mário, em ato inusitado de volúpia, desencrava o passado: - quem contara desídia imputada a outrem é o real protagonista desta. Silenciado, pelo filho, apagamento paterno (passado) que remanesce amordaçado no avivamento (presente), retroalimenta-se contumaz desconfiança da mulher em relação ao marido. Sortilégio? Leitura inquietante. Só a loquacidade do velho instaura desagregação presente? Improvável. Desassossego familiar tem razões fundas e marcas indeléveis; explodem quando expostas em confronto ao sombreado de duas figueiras centenárias. (“Por conhecer esses detalhes da vida de Eduardo, Flávia decidiu pontuar a discussão, para ver se o convencia a abandonar a ideia de não visitar mais o pai no asilo. / Não via motivos para que ele tomasse uma decisão tão radical. Se o velho morresse sozinho, não se sentiria culpado pelo resto da vida? (..) Assim, ele retomaria o convívio com os filhos e melhoraria a relacionamento com a família. (..) Assim que chegaram ao asilo a atendente se apresentou para mostrar-lhes o caminho que os levaria até onde se encontrava o velho. Durante a caminhada (..) não poupava elogios ao pai de Eduardo”. – pg.13, 14 e 15). O legado do velho, a quem viesse cuidar do seu enterro, avassalador: Nada o abismo deu ou o céu mostrou. Só o vento volta onde estou toda e só, E tudo dorme no confuso mundo.
 
Porto Alegre,25 de Outubro de 2013.
 
VirgíniaH. Vianna Rocha
 

Academia Rio-grandense de Letras

PATRONOS

CADEIRA 40

Alceu Wamosy

Alceu de Freitas Wamosy nasceu em Uruguaiana, Rio Grande do Sul, em 14 de fevereiro de 1895, filho de José Afonso Wamosy e Maria de Freitas Wamosy. Es-tudou no Colégio Urugiiaianense, de sua cidade natal e em Alegrete. Jornalista desde a adolescência, Alceu Wamosy iniciou-se como redator de A Cidade em 1909 na cidade de Alegrete. Em 1911 já dirigia o mesmo.

Em Porto Alegre, foi redator, em 1915, de O Diário e A Federação. Em 1918, foi diretor em Santana do Livramento de O Republicano. Em 1923, com o início da Revolução...

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