TEXTOSENSAIOS

Dois nomes - José Carlos Laitano

20 de junho de 2018

Muitas personalidades integraram as diversas Academias no Rio Grande do Sul, hoje a Academia Rio-Grandense de Letras, mas dois deles destacaram-se como líderes cuja ação associativa permitiu a criação ou renovação das entidades. Um deles surgiu no início da Academia, Olimpio Olintho de Oliveira; o outro, Dante de Laytano, na quadra final do mesmo século. Um deu a vida, o outro injetou sangue.

O primeiro deles foi Olintho de Oliveira, este o seu nome literário, e pelas suas mãos surgiu a Academia Rio-Grandense de Letras, em 1901.

Nascido em Porto Alegre, em 5 de janeiro de 1845, estudou medicina no Rio de Janeiro. Formado, retornou e logo ajudou a fundar a Sociedade de Medicina de Porto Alegre e, no mesmo ano, colaborou com a fundação da Faculdade de Medicina de Porto Alegre e ali integrou o quadro de professores. Quando ocupou a Direção da Faculdade, criou o Instituto Pasteur, para tratamento preventivo da raiva e, logo adiante, o Instituto Oswaldo Cruz. Na mesma época participou da fundação da Sociedade Brasileira de Pediatria, no Rio de Janeiro. Escritor dedicado principalmente a assuntos médicos, apreciador das Belas Artes, colaborou na criação do Instituto Livre de Belas Artes do RGS. E tal espírito associativo e empreendedor levou-o à fundação da Academia Rio-Grandense de Letras, sendo o seu primeiro Presidente.

Não sendo escritor proeminente, inscreveu seu nome como ativista cultural e foi o mentor da Revista da Academia, embora esta só viesse a ser editada dez anos mais tarde. Pontificou os principais princípios e objetivos da Academia, vigentes ainda hoje e, por tal razão, a Academia é conhecida como a Casa de Olintho de Oliveira.

Como consta no capítulo Surge a Academia Rio-Grandense[1], Olintho de Oliveira reuniu um grupo de intelectuais, alguns oriundos do Parthenon Litterario. Embora oficialmente fundado a 01 de dezembro de 1901, a sessão solene de sua instalação e eleição da primeira diretoria só aconteceu a 10 de maio de 1902. Após um período de muitas realizações culturais e o agravamento das divergências com Aurélio Verissimo de Bittencourt, principalmente por razões políticas, Olintho retornou ao Rio de Janeiro, onde fixou residência, afastando-se da agremiação.

Mais tarde ele seria reconduzido à Academia através de insistentes pedidos formulados por Ary Martins, e isto no ano de 1935, quando a Academia Rio-Grandense de Letras seria reerguida, saindo do seu sonolento período desde 1903.

Num trecho da carta onde respondeu ao chamado (consta no capítulo Academia de Letras do RGS), agradeceu por ser lembrado pela nova geração de intelectuais, apesar do tempo e da distância e reconheceu a demasia de suas atitudes quando deixou a Academia e isso creditou ao adolescente que era que, “ao penetrar de subito na vida, desdobrando orgulhosamente as azas que lhe emprestam a phantasia e o ardor da mocidade, julga-se capaz de todas as façanhas e proezas”.

A vida associativa e cultural de Olintho de Oliveira merece texto mais abrangente, escapando aos limites desta homenagem que aqui enaltece a sua memória como pessoa fundamental na vida acadêmica deste Estado.

O segundo nome aqui homenageado também é conhecido por seu nome literário.

Dante de Laytano foi quase tudo na vida: promotor público, magistrado, professor universitário, diretor de jornal, articulista; pense uma função na Sociedade e provavelmente ele a terá exercido. Tive a honra de entrevistá-lo logo antes da sua morte, uma gravação dificultada pela pronúncia das palavras. Dante de Laytano foi uma figura pública que me acompanhou desde sempre: quando dizia meu sobrenome num balcão de loja, banco, repartição pública, logo o atendente perguntava qual o grau de parentesco com ele. Era figura conhecida também por sua presença na televisão, durante um certo tempo, quase diária. Quando surgiu o jornal Zero Hora, substituindo o Última Hora, empastelado pela ditadura de 1964, eu trabalhei como repórter policial e Dante de Laytano era diretor, e sua sala, pequena e envidraçada, era contígua à redação. Jornal iniciante, instalações acanhadas, a Direção próxima aos funcionários. Um dia perguntei a ele sobre nosso parentesco, já que ambos provínhamos, em nossa origem, da pequena cidade de Morano Calabro, na Reggione Calabria, ao sul da Itália. E ele respondeu-me que éramos primos em grau mais distante. Quase trinta anos mais tarde aconteceu a entrevista, em sua casa, já muito doente, ao longo de vários dias, oportunidade na qual examinei cada uma de suas obras, na sua biblioteca particular, e recolhi várias fotos, inclusive dos seus documentos.

É considerado como um dos maiores presidentes que a Academia conheceu. Quando, mais uma vez, a entidade reduziu suas atividades ao mínimo, quase nada, foi ele quem assumiu o timão e, com a prodigiosa capacidade de trabalho e facilidade no trato com as pessoas, revitalizou a entidade, que assim permanece até hoje.

O jornal Correio do Povo noticiou o seu ingresso em reportagem de meia página, sob o título Dante de Laytano empossado na Academia de Letras do RGS. A posse teve lugar no plenarinho da Assembleia Legislativa, passando ele a ocupar a Cadeira nº 19, vaga em face do falecimento de Poty Cachapuz Irineu de Medeiros, e cujo Patrono é João Cezimbra Jacques.

Arthur Ferreira Filho encarregou-se da saudação[2], eis alguns tópicos:

De fato, o nome de Dante de Laytano há muito transcende as fronteiras da nossa Província e de nossa pátria, como as do próprio continente latino-americano.

É conhecido nos países da latinidade e estimado na terra mater da civilização brasileira, aquele pequeno e grande e glorioso Portugal, onde se encontram as raízes da nossa cultura, a mesma velha cepa, fecunda como a loba romana, que floresceu em Camóes, Padre Vieira, Alexandre Herculano e Eça de Queiroz, e aqui foi exuberante e bela com Rui Barbosa, Machado de Assis e Olavo Bilac.[...]

Dante de Laytano é um prodígio de atividade. Nele temos visto, mais de uma vez, confirmado aquele princípio da sabedoria popular: “Se queres algo sem demora, confia-o a um homem ocupado”. [...]

Dá uma aula em Porto Alegre, preside uma sessão da Academia Brasileira de História, em São Paulo, realiza uma conferência em Brasília, participa de um Congresso em Salvador da Bahia. E ainda lhe sobra tempo para cuidar dos amigos e escrever-lhes com afeto.

Espírito criador, nunca se contentou em cumprir simplesmente o dever.

Diretor do Museu Júlio de Castilhos, realizou o milagre de arranjar recursos para reeditar a antiga Revista, que tanto serviria aos estudiosos da nossa história e que adormecera, havia vinte anos.

Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, como Diretor da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, deu vida ao Boletim e à Revista, ambas publicações de inestimável valor.

Sua produção literária é vastíssima. Além da ‘História da República Rio-Grandense’, obra de consulta obrigatória para o conhecimento do Decênio Heróico, e o ‘Almanaque do Rio Pardo’, precioso repositório de informações sobre o alvorecer do Rio Grande, publicou uma opulenta relação de trabalhos no campo da história da sociologia, da economia, da lingüística, do folclore, que nobilitam a bibliografia gaúcha: ‘O presídio de Torres’, ‘Litígio em Santa Catarina’, ‘Colonização açoriana no RGS’, ‘Fazendas de criação de gado’, ‘O negro e o espírito guerreiro’, ‘Vocabulário de pescadores’, ‘Origens do folclore brasileiro’ e dezenas de outros que, se a todos pretendêssemos citar, levaríamos longe demais esta oração que, em princípio, apenas se destina a saudar o novo confrade que chega.

Pertence Dante de Laytano a um grande número de associações culturais do Brasil e doutros países, entre as quais a Academia Brasileira de História, de que é o atual presidente, o Instituto Histórico e Geográfico do RGS, o Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo e a Academia Portuguesa de História.

Esta, como se sabe, é uma das mais antigas e conceituadas do gênero, na Europa e em todo o mundo ocidental, tendo precedido no tempo a própria Academia das Ciências de Lisboa.

Além dessas ocupações, Dante de Laytano foi Doutor em Direito pela UFRGS, três vezes escolhido Personalidade do Ano, Diretor do Arquivo Histórico do RGS, pertenceu ao Comitê Internacional de Museus no cargo de Vice-Presidente da Delegacia Brasileira, ao Conselho Estadual de Educação, à Comissão Nacional de Especialistas do Ensino da Faculdade de Filosofia. Professor catedrático de História da Civilização Brasileira. Chefe do Departamento de História da América e Folclore da PUCRS, titular da Cadeira de História do Brasil, na Universidade de Caxias do Sul. Pronunciou conferências nas universidades do Texas, Columbia, Harward, Stanford, California, New Mexico, Vermont. Hóspede oficial da Rockfeller Foundation Northwestern University. convidado oficial do Instituto de Coimbra; da Sociedade Amigos do Brasil, em Paris; Fundação Duque de Bragança de Vila Viçosa, Círculo Eça de Queiroz de Lisboa. Presidente da Comissão do V Centenário de Pedro Álvares Cabral e orador oficial do centenário de Graça Aranha e Pandiá Calógeras e oitenta anos de Agripino Grieco; Presidente de Honra do IV Seminário de Arqueologia. Tem condecorações da Itália, França, Polônia; Presidente da Comissão de História e Cultura do Centenário da Colonização Italiana.

Em 1980 foi eleito Presidente da Academia Rio-Grandense de Letras e logo anunciou projetos da gestão: criação da Revista da Academia; instituir Prêmio significativo; resolver a questão da sede própria; cursos e conferências; publicação de livros.

Dante de Laytano revitalizou a Academia, criou várias comissões e para elas nomeou muitos dos membros da entidade; a Revista começou a ser editada e assim permanece até os dias atuais.

 


[1]In José Carlos Rolhano Laitano, História da Academia Rio-Grandense de Letras (1901-2016) e Parthenon Litterario (1868-1885),

[2] Jornal Correio do Povo, Porto Alegre, edição de 29 novembro 1978, p. 15.

Academia Rio-grandense de Letras

PATRONOS

CADEIRA 3

Felix da Cunha

Félix Xavier da Cunha nasceu em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, no dia 16 de setembro de 1833, filho de Francisco Xavier da Cunha e Maria Quitéria de Castro e Cunha. Era irmão de Francisco Xavier da Cunha. Cursou humanidades no Colégio Dom Pedro II no Rio de Janeiro de 1843 a 1848. Formou-se bacharel em Direito em São Paulo no ano de 1854. Após a formatura, mudou-se para Porto Alegre, exercendo a advocacia a partir de 1955.

Como jornalista, dirigiu em Porto Alegre O Propagandista e O Mercantil. Em 1861 fundou O Guaíba. Além das atividades ligadas à advocacia...

continue lendoCONTINUE LENDOcontinue lendo