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O Prêmio Ig-Nobel - Heino Willy Kude
30 de novembro de 2014
Foi criado no início da década de 1990 o Prêmio IG-Nobel, a partir da palavra inglesa Ignoble que significa algo como depreciativo ou nesta mesma direção. Seria como uma sátira ao prêmio Nobel que anualmente é conferido em Oslo e Stockholm premiando trabalhos notáveis de cunho científico ou em favor de um melhor entendimento entre os povos.
Em parte, os criadores deste prêmio tinham absoluta razão em assim agir, pois chega a ser ridículo o excesso de trabalhos de mestrado e doutorando que são exigidos para conseguir um título para ser-se o preferido para ocupar uma simples vaga de professor universitário. À parte aqui as exigências são de todo descabidas. Ocorreu uma evolução no critério da indicação de um professor universitário e o modo do mesmo ministrar a aula. Professor, acima de tudo deve saber ensinar, o que se chama didática. O que adianta Albert Einstein ou Max Planck – só para citar dois exemplos – com o seu incontestável saber e múltiplos conhecimentos serem professores universitários, caso não souberem ensinar? São inúmeras as pessoas que não sabem expor o que conhecem, pois o que delas se exige é que saibam aplicar seu saber num trabalho de laboratório.
Mas não custa também enveredar para um outro aspecto do ensino universitário. Justamente pessoas de imenso saber podem prestar trabalhos, terem seus escritórios. Lógico o que vou agora dizer só se aplica para um pequeno grupo de pessoas de caráter deletério. Eles podem ver nos estudantes futuros concorrentes e não ensinar tudo que sabem e conhecem. O professor deve ter didática e no meu entendimento pessoal no caso do ensino universitário especificamente não teria importância se abri um livro e o consultar na aula e depois expuser melhor que o que se acha escrito ali, respondendo perguntas. Em verdade em tudo que lemos podem surgir dúvidas que o lente consegue esclarecer. Assim, creio eu poder dizer racionalmente, não há necessidade de termos professores(as) de notório saber. E efetivamente esta gama de trabalhos de mestrado e doutorando tem – salvo melhor juízo – muito pouco valor. A respeito de livros didáticos já me disseram o que normalmente encontramos neste mundo dinâmico, foi escrito numa época em que o conteúdo já pode ser considerado superado. Desculpem a malícia destas minhas colocações. Defendo a tese que o professor universitário deve ter acima de tudo a capacidade de se fazer entender no decorrer de uma aula, tendo talvez até os conhecimentos minimamente exigidos para a matéria que ensina. Sobre estes trabalhos de doutorando e mestrado ainda convém dizer o seguinte detalhe: É proibido copiar! Isso que digo aqui pode parecer o óbvio, o mínimo. Pois, não o é: Posso avaliar aleatoriamente que por ano em todo o mundo devem ser escritos cerca de mil trabalhos por disciplina. É uma avaliação e caso um leitor me disser que seriam quinhentos ou dois mil, eu concordaria. Pergunto de que modo podemos evitar que involuntariamente ocorra um plágio? Dois políticos de peso na Alemanha foram condenados devido a isso. Ainda bem que eu escrevo crônicas despretensiosas e todos saberão que um escriba como eu sempre posso estar copiando baseado no simples fato de não poder ler tudo que alguém escreveu, talvez até um dia antes de mim.
Creio que esta situação levou algumas pessoas a criar o Prêmio IG-Nobel que tem um ponto positivo, seja o de apontar o dedo para a falsa erudição de pessoas que querem dar importância e fama a si mesmas. Existe o famoso caso Sokal que foi um escândalo nos meios intelectuais. Em 1996 Alan Sokal professor universitário publicou na revista Social Text, editado pela Duke University Press um artigo intitulado Transgredindo as fronteiras em direção a uma Hermenêutica Transformativa da Gravitação Quântica. Numa outra revista Alan Sokal confessou que tudo que escrevera é non-sense (em bom português: besteira erudita). Por mais que podemos nos divertir com alguém que teve a coragem de denunciar finalmente a assustadora e entravadora linguagem pomposa de certos cientistas de segunda linha, a meu ver não seria este o caminho. Alan Sokal deveria ter seguido os passos de Jonathan Swift que nas Viagens de Gulliver faz o seu herói chegar à Ilha flutuante Laputa onde viviam cientistas alienados. Aqui Swift ataca a Royal Society. Mesmo que não se possam chamar os cientistas que vivem atualmente de alienados (pelo simples fato de as transformações que hoje se observam não mais permitirem os conhecimentos supostamente corretos ficarem instalados numa mente alienada de um ancião que já deveria ter se aposentado), cabe criticar ainda o fato de na falta de conhecimentos comprovadamente comprovados (e isso ainda existe) se encobrir a ignorância por meio de termos pomposos.
Mas não para ali. O Prêmio IG-Nobel pode surpreender qualquer um que esteja realizando um trabalho comunitário, no qual cometeu um erro (que em alguns casos chega a ser imperdoável). Temos, por exemplo, o caso de um grupo de escoteiros (Éclaireurs et Éclaireuses) que se empenhava em apagar em lugares notáveis e monumentais pinturas dos inconvenientes grafiteiros. Pois esta intenção só pode merecer aplausos, mas estes escoteiros franceses entraram numa caverna e apagou pinturas rupestres pré-históricas de imenso valor cultural. Foram devidamente homenageados. Valeu pela intenção o que os escoteiros fizeram e seria injusto serem assim expostos à chacota? Não, pois em tudo que fazemos, o essencial é termos conhecimentos.
Dois outros casos merecem serem citados e que se referem a algo que em alguns livros meus procuro combater. Estou convicto de que Deus existe, como por exemplo, o tentando explicar no meu livro Quem Seria Deus?, mas não aceito de modo nenhum dogmas radicais de qualquer religião. Assim o cidadão Robert Faid se fez merecedor do prêmio de matemática por ter calculado que Mikhail Gorbatchev com uma probabilidade de 710.609.175.188.282.000 contra 01 seria o Anticristo. Os números indicam que não existe a menor probabilidade de erro, de modo que apelo aos que afirmam Napoleão, Hitler ou Stalin ter sido o Anticristo, doravante se calarem, pois os números dizem o contrário. Muito merecidamente Robert Faid mereceu o prêmio IG-Nobel. Merecedor da distinção foi também a Igreja Batista Sulista de Alabama que instituiu medidores matemáticos de moralidade que consegue avaliar distrito por distrito, quantos cidadãos irão ao inferno, caso não se arrependerem.
Um outro Prêmio foi conferido em biologia a Gareth Jones da Universidade de Bristol (Inglaterra) e Min-Tan do Instituto Entomológico de Guangtung (China) que independentes um do outro descobriram que além do homem, morcegos praticam o sexo oral para prolongar o prazer do ato sexual. Ligado com a biologia também é o caso do estudo de C. W. Moeliker de Rotterdam (Países Baixos) que conseguiu documentar um caso de necrofilia homossexual de um pato. Também em biologia foi concedido o talvez não muito disputado prêmio a Buck Weimer de Puebla no estado do Colorado (USA) que propôs fabricar roupas de baixo dotadas de um filtro de carvão ativado substituível para anular o efeito das flatulências antes que escapem ao meio-ambiente.
Um livro que mereceu o prêmio é o conhecido best-seller de Erich von Däniken Eram os Deuses Astronautas? Comprei este livro, pois era muito comentado na época. Impressionou o que ali foi dito, mas apresentou uma tese que me chocou e que o fazia ser merecedor de um segundo prêmio: Disse Däneken que os astronautas copulavam com mulheres da terra e geraram filhos. Ora, se uma égua coberta por um touro não procria como é que um ser de outra constelação vai gerar um filho numa mulher? A não ser que os extraterrestres consigam fabricar o DNA humano e o injetar em si mesmos.
Outra obra premiada é de uma defensora do respiracionismo Ellen Greve ou Jasmuheen sustentando em seu livro que embora algumas pessoas comam, não realidade, não necessitariam fazê-lo. Em lingüística Juan Manuel Toro, Josep Trobalan e Nuria Sebastian Galles descobriram que ratos não conseguem diferenciar ordens dadas em japonês das de mesmo conteúdo em holandês, caso tocadas de frente para trás.
Acredito que a quase obrigatoriedade da apresentação de teses originais faz com que muito candidato ao título de doutor faz com que muitas pessoas capazes – com medo de cometerem plágio - se valham de estudos completamente inúteis. Assim quero citar um caso que indica terem Marie-Christine Cadiergues, Christel Joubert e Michel Franc trabalhado muito, terem realizados inúmeros testes para chegar à transcendental conclusão de que pulgas que vivem em cães saltam mais alto que os seus irmãos moradores em gatos.
Mas existem casos em que pesquisadores de escol chegaram a conclusões importantes e as terem mal-formuladas. Jacques Beneviste chegou à aparentemente muito estranha conclusão de que a água seria um líquido inteligente dotado de boa memória. Como quase sempre acontece, eu em boa companhia de muitas outras pessoas – incluindo talvez membros da comissão julgadora do Prêmio IG-Nobel – sendo dotados de uma boa dose de ignorância, passamos a rir. Pois Jacques Beneviste era um dos colaboradores do Instituto de Pesquisa Médica e Saúde Francês que em 1988 escreveu o trabalho antes citado, mas que depois provou que substâncias muito diluídas produziam efeitos sobre basófilos. Com o prêmio IG-Nobel, perdeu toda a sua credibilidade e teve que se afastar do instituto em que trabalhava. Em 2010 o virologista Luc Montagnier, ganhador do premio Nobel de Medicina e Fisiologia (pela descoberta do vírus da HIV) disse dele ter feito uma descoberta muito importante no que tange à comprovação da tese homeopática de altas diluições serem atuantes. Diz o virologista que o premio IG-Nobel criou um terrorismo no mundo da ciência e que outros pesquisadores, reproduzindo as mesmas experiências, teriam chegado às mesmas conclusões quanto è eficácia da água diluidora. Mas de justos receios não as publicam. Jacques Beneviste teria estado bem à frente de seu tempo.
Eu falo disto aqui para apontar para um dos perigos inseridos nos prêmios negativos. Nem sempre prêmios positivos são conferidos a pessoas merecedoras. Para isso acontecer, há necessidade de reciclar a mente humana. No que se refere à chacota, a humanidade e os cientistas não fogem da seguinte regra: Quando uma pessoa importante ri, muitos a imitam, rindo igualmente. Não instigo ninguém a deixar de rir, mas que sempre saiba explicar de por que ri.
De outra, deveriam os organizadores pensar em algo bem diferente. Estamos vivendo num mundo em a única coisa que não falta, são problemas. Na Somália neste preciso momento em que escrevo este artigo talvez vinte crianças estejam morrendo de fome. Estão fazendo apelos para que ajudem. Conhecem a história daquele pai de família que no fim do mês traz para casa ora um novo televisor, ora um quadro a óleo artístico, com seus ganhos de cerca de quatro salários mínimos? Nunca ouviu os reclamos da sua esposa que insistia que não conseguia reunir dinheiro para comprar frutas e leite para as crianças. Eis como estamos agindo. Vejam, quem merece o prêmio IG-Nobel seria a FIFA (Federação Internacional de Futebol) que organiza o campeonato mundial de futebol de 2014 e exige construção de grandes estádios, candidatos vencedores a elefantes brancos. Dir-se-ia que o dinheiro retorna com a venda dos ingressos, mas este mesmo dinheiro viria também com o uso dos estádios atuais. Parece que vamos gastar cerca de dez bilhões de reais nesse empreendimento. Quantas casas poderiam ser construídas com o mesmo dinheiro para as camadas pobres do nosso povo? Cito esta necessidade para anular o argumento de que a construção de estádio propicia a muitos desempregados a chance de uma colocação no mercado de trabalho. A construção de um milhão de casas populares tem o mesmo efeito benéfico. A nível mundial devemos nos lembrar de revitalizar os desertos. Neste mesmo sentido tenho em relação à curiosidade científica lá as minhas restrições. Agora mesmo está viajando rumo ao planeta Júpiter uma nave para pesquisar a consistência deste corpo astral. Ciência, acima de tudo deve trazer efeitos práticos e benéficos, admitindo-se evidentemente algumas pesquisas que talvez a um prazo mais longo possam indicar resultados, mas me explique uma pessoa para o que gastar bilhões para ver como funcionam as coisas em Júpiter! Já disse que tenho dentro de mim uma certa dose de ignorância e estou de ouvido atento daqui em diante. Certamente virá uma explicação razoável a indicar um vestígio de praticidade que pode resultar deste mega-investimento.
Outro exemplo é o acelerador de partículas, o túnel de dimensões gigantescas situado nas proximidades de Genebra que conseguiu produzir uma colisão, criando uma explosão que os cientistas chamam de big-bang em miniatura, aplaudindo-o. Eu também aplaudiria, se não fosse algo cujos custos excessivos e limitadíssima praticidade (em comparação com os problemas da fome e necessidade de revitalizar mares e desertos) não conseguem ser comprovados. No mais só posso confessar o meu espanto com os resultados obtidos e tiro o chapéu aos que realizaram tal façanha monumental.
Aqui a comissão encarregada de premiar anualmente os merecedores do Premio IG-Nobel deveria saber superar-se e não se limitar a premiar o aparentemente ridículo e erros cometidos, por exemplo, pela má aplicação de recursos, de acidentes (causados por falta de previsão e medidas acauteladoras) ou boa vontade mal direcionada (muitas vezes por falta de conhecimento da natureza humana). Insisto que haveria necessidade de uma visão mais globalizada no que se refere aos problemas do futuro de um planeta super-povoado.